Revista do Clube Militar - Nov/Dez-91

        Amazônia II

 A NAÇÃO IANOMÂMI
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- Transcrição do Editorial do Jornal O Globo, de 19 Nov 91 -

    O Governo do Brasil, por portaria do Ministro da Justiça, assegurou à nação ianomâmi a posse permanente de uma área na fronteira com a Venezuela e a Guiana, abrangendo a extensão de 9,4 milhões de hectares, equivalente a três vezes a superfície da Bélgica.
    Em agosto último, o Governo da Venezuela também destinou à nação ianomâmi, na fronteira com o Brasil, uma área do seu território com a extensão de 8,3 milhões de hectares,  reconhecendo-a  como "patrimônio da Humanidade".
    Por conseguinte, a superfície ocupada continuamente pela referida população indígena, que no Brasil atinge a cerca de 12 mil pessoas, passou a ser de 17,7 milhões de hectares, recebendo a denominação oficial de "Terra Indígena Ianomâmi".
    Tendo em vista o risco de que essa unidade territorial, que ultrapassa fronteiras, possa justificar futuras intervenções estrangeiras para mantê-la - tal como está ocorrendo neste momento em outros países -, principalmente pela cada vez mais deformada imagem do Brasil no exterior, o Exército sugeriu que, na faixa limítrofe que a Constituição considera fundamental para a defesa da soberania nacional, fossem tomadas medidas de acautelamento que se conciliem com a preservação das atividades indígenas e, inclusive, possam dar-lhes maior segurança.
    A sugestão foi recusada. Com isso, o Brasil logrou tranqüilizar as Organizações Não Governamentais (ONGs), sediadas em Londres, que ameaçaram boicotar a Conferência Rio-92, caso a demarcação não fosse assinada antes da próxima reunião mundial, de 12 de dezembro, em Paris, a ser presidida por François Mitterrand, que, em 1989, proclamou que a soberania não pode servir de pretexto para agressões ecológicas.
    Também o Parlamento britânico, que enviou ao Brasil o Deputado John Battle, para comunicar a preocupação do Governo inglês com a situação dos ianomâmis, foi atendido, como atestam as reações favoráveis da imprensa.
    O Ministro Passarinho, para justificar a medida, assegurou que a mesma reforça a soberania nacional, ao dar "efetivação ao artigo 20 da Constituição, que inclui, entre os bens da União, as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, e o artigo 231, que estabelece que essas terras são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas, imprescritíveis".
    Na verdade, a Carta reconheceu os direitos dos indígenas, mas o mesmo artigo 20, no seu parágrafo 2o, determinou que a faixa de fronteira de até 150 quilômetros de largura é "fundamental para a defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei".
    Torna-se assim difícil compreender que os entendimentos entre o Ministério da Justiça e os dirigentes ianomâmis, com intermediação da Funai, tenham resultado em que o Exército, para cumprir suas atribuições agravadas pelos riscos que hoje afloram na Amazônia, de atuação do narcotráfico, de guerrilheiros e de contrabandistas, manterá apenas seis postos em toda a linha fronteiriça, em locais que não prejudiquem as atividades do "número muito grande de índios que se concentram naquela zona" e que, sendo nômades, precisam de grandes extensões livres para percorrê-las.
    Neste momento, o Ministro da Justiça elabora a proposta sobre o uso das terras demarcadas a ser apresentada ao Presidente da República e submetida ao Congresso e ao Conselho de Defesa Nacional.
    Convém portanto registrar, para esclarecimento da opinião pública, que a matéria em questão é abrangida pela Constituição, não em dois, mas em diversos artigos, conforme publicamos nesta página.
    Cabe ainda lembrar que o Exército, na sua atuação em territórios ocupados por populações indígenas, durante toda a nossa História, jamais representou qualquer ameaça à sua preservação. Enquanto isso, o passado das nações desenvolvidas lhes retira autoridade para nos dar lições de manutenção de florestas ou de respeito aos povos nativos que foram alvo de sua colonização. O Brasil é que tem alguma coisa a lhes ensinar, na obra e no lema de ação do inesquecível Marechal Rondon.
    Quanto ao Ministério das Relações Exteriores, é preciso que a transferência para Brasília não leve seus atuais responsáveis ao esquecimento dos serviços prestados ao País, notadamente na delimitação de nossas fronteiras na Amazônia, pelo Barão do Rio Branco, a quem, em 28 de fevereiro de 1904, Olavo Bilac saudava, abençoando-o pela "fortuna de assinar três vezes os tratados que salvaram e mantiveram a integridade do solo brasileiro".
    O  próprio Barão, em discurso no Clube Militar, advertia que o Brasil teria de se manter atento nos entendimentos  internacionais, jamais adotando posições que, na hora, sendo louvadas por interesses inconfessáveis, pudessem dar margem a futuras alegações indevidas. Havia que se ter sempre em vista que cada parcela do nosso território, tendo sido conquistada por meios suasórios e jurídicos, exigia, para ser preservada, que fosse "seriamente organizada a defesa nacional", pois "não se pode ser pacífico sem ser forte".


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